quinta-feira, 6 de agosto de 2009

O pai do meu pai

familia 001Meu avô Giobatta. 

Não o conheci. Trinta anos separam sua morte do meu nascimento, no entanto, sua imagem é tão viva dentro de mim como se ainda ontem eu tivesse falado com ele.

Sei tudo sobre sua vida e tenho por ele um carinho e um  respeito imenso.

Nascera na metade do século XIX, na Itália, numa pequena cidade chamada Sanguinetto. Era o segundo filho do segundo casamento de sua mãe. Ainda garoto presenciou forte terremoto que de tanto que a terra balançou até os sinos da igreja tocaram. Por volta dos 12 anos seu pai sumiu depois de uma briga com um empregado e nunca mais se soube dele. Ele se tornou o responsável pelos irmãos menores e também pela mãe.

chiesa di San Giorgio

Igreja de San Giorgio Mártire (Sanguinetto- Itália) onde meu avô foi batizado em 1865 e se casou em 1887.

Se casou aos 21 anos  e apenas terminou o serviço militar, vendo a dificuldade por que passava sua família, pensou em “fazer América”. Assim, com a mulher grávida, a mãe e os irmãos menores embarcou seu sonho no porto de Gênova. Chegou no Rio de Janeiro no dia 15 de novembro de 1887.

    stazione 2

Estação de trem de Sanguinetto    Navio - scielo.br

Aqui ainda haviam escravos. Os negros eram uma novidade para ele e sua família pois nunca haviam visto antes nenhuma pessoa que não fosse de pele branca. Foram levados  para uma fazenda de café, no interior paulista, pois os donos já previam o fim da escravidão e faziam propaganda da América na Europa a fim de atraírem os imigrantes para substituí-los, principalmente, na colheita do café.

Terra brasileira .net

As condições de vida, tirando os castigos físicos, quase nada diferia da dos negros. Um casebre, colchão de palha, o salário apenas servia para pagar as passagens e, a despesa com a comida ficava  em débito na venda do patrão. Mas, trabalhou de sol a sol e, aos poucos conseguiu comprar sua própria terra e saiu dali para morar num lugar chamado Bom Jardim. Imagino que aquele pedaço de terra, para ele, fosse um jardim mesmo, pois representava sua liberdade e a esperança de uma nova vida.

Homem simples e rude. Com a força de seus braços criou os 20 filhos. Certo é que alguns morreram ainda crianças e duas morreram na juventude. Uma no parto do primeiro filho, aos 20 anos e a outra, com apenas 17, quando soube da morte da irmã também não resistiu. Dá para imaginar como fica o coração de um pai numa hora como esta. Mas sua força interior o levava sempre adiante. Quando sua mãe morreu, octagenária, era já um homem rico e mandou publicar no jornal de São Paulo a morte e a missa de sétimo dia.

Para surpresa dele e de todos, dias depois, surge na fazenda um trole trazendo um homem de longas barbas brancas. Assim que meu avô o viu logo gritou para os funcionários do engenho: “VARDA ME POPA”. Vejam meu pai!

historiadeindaiatuba.blogsp...

Emoção e alegria como aquela deveria ser festejada. Um reencontro depois de quase 40 anos sem saber uma única notícia. Foi através do anúncio da morte de sua mulher publicado no jornal, que fez meu bisavô descobrir que sua família também estava morando no Brasil.

Os festejos duraram uma semana. Todos os parentes vieram para conhecê-lo. Meu pai era um garoto de 10 anos na época mas sempre se lembrava deste fato e,  quando o recontava as lágrimas lhe saltavam dos olhos.

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Meu pai: João, caçula dos 20 filhos de Giobatta.

Assim meu pai foi criado, respeitando os mais velhos e, assim ele me criou, valorizando a família e suas raízes.

Tive uma educação muito rígida, mas nunca levei um tapa sequer. Bastava um olhar e sabia exatamente o que ele queria dizer. Claro, que por muitos anos, fiquei ressentida por muitas atitudes de meu pai.

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Angela aos 2 anos.

Hoje entendo que, dentro de toda sua rigidez, o que ele queria mesmo era manter os bons princípios, dentre eles o respeito ao próximo e principalmente aos mais velhos. Tudo tinha de repartido igualmente entre os filhos. Ninguém tinha privilégios. Ninguém passou fome, mas trabalho também nunca amedrontou ninguém.

Hoje, em pleno século XXI, vemos o que a falta de limites e respeito têm feito dos nossos jovens. Eu tive uma educação moldada no século XIX e tive de educar meus filhos para viverem no século XXI. Espero que eles continuem valorizando suas raízes, seus pais, seus avós e bisavós.

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André e Henrique, meus filhos.

Nossos antepassados são como o tronco da videira. Não importa quantas vezes seus galhos tenham de ser podados, se o tronco for forte, eles brotarão e frutos cada vez melhores dele nascerão.

Domingo é dia dos pais. Que este dia seja lembrado não só pelos presentes, mas sobretudo pelo respeito aos idosos que um dia foram seu sustento e deram todo seu suor e sonharam junto com vocês.

Nunca devemos pensar que somos mais que nossos pais. Se somos hoje o que somos, devemos antes de tudo a eles.

Feliz dia dos pais a todos.

11 comentários:

Luantes disse...

Gostei
Uma linda e emocionante história de vida que poderiamos comparar a uns bons milhares d e emigrantes que a partir dessa data se fizeram ao mar outros por terra e a inda outros mais tarde pelo ar á procura de melhor vida para suas familias.
TU tens uma memória optima
contas tudo isso como se tivesse passado contigo mesma
lindo
adorei
bjss

Elaine Gaspareto disse...

Olá!
Angel, que relato mais lindo!
Tenho muita vontade de conhecer melhor minhas raízes. Quem sabe ainda não pesquiso...
Beijos.

dapazzi disse...

salve, angela, una bella historia, felicidades.

Cris Michelon disse...

Angela, fiquei emocionada com teu relato, meu bisa tb veio da Itália, meu avô nasceu aqui no Brasil com um simples olhar sabíamos s era um sim ou um não.
Adorei.
Parabéns a todos os pais desta linda flia.
bjs

Uno Storese disse...

Ciao Cara cugina Angela è con viva e grande sorpresa e felicità leggere la storia e vedere l' immagini della tua Famiglia Zontini. Leggere le difficoltà che questa famiglia a dovuto passare , per il bene dei suoi discendenti . Devi essere molto fiera di questa famiglia che ora è cittadina del mondo .Auguro a TE e alla tua discendenza tantissima felicità e fortuna .
saluti Fulvio

http://saia-justa-georgia.blogspot.com/ disse...

Nossa Angela, fiquei emocionadissima com a história do seu avô, do seu pai e a educacao que você recebeu. Que emocao deve ter sido para seu pai aos 10 anos ver o avô chegando, fiquei arrepiada. Esses tempos nao existem mais.Essa magia parece que se foi...nao sou deste tempo tao antigo, mas recebi uma educacao tb bem severa.

Bom fim de semana e lindas as criancas na foto.

Fernando rodrigo disse...

Minha querida começo com grande entusiasmo e termino sempre de lágrimas a cair rosto abaixo,
mas creia-me como me dá um prazer enorme ler os seu escritos, são aempre de uma dignidade que me fazem muitas vezes e em muitas coisas ver pedaços de mim.
Talvez seja por essa razão que eu gosto verdadeiramente de voçê.
Beijo em sua alma meu anjo sem asas

Graciete Filipe

vieira calado disse...

Outros tempos...

outras vidas...

Beijinho

e bom resto de domingo

Nanda Botelho disse...

Historias de família são legais!

Um ótimo dia para vc!

Bjão!

João Diógnes disse...

Angela, vc. está de parabéns, com esta homenagem.
Você disse: "O pai do meu Pai" e, eu vou dizer: "O pai do meu Avô", (o nono) Paschoal, nosso eterno Pascoalin ou Pai da Kinha" para nós.
Cofesso-lhe, tamanha foi minha emoção, quando encontrei,até gritei: "não é possível, é o meu bisavô".
Eu não o conheci, mas também sei tudo da sua vida, através do "Tio Joanin" seu pai, que quando nos contava as passagens, sempre terminava em lágrimas.
Sei ainda, muito mais, porque minha Mãe "Alvira",também nos contava,sobre nossas origens, sempre repetindo as proezas, as façanhas, mas era dificil terminá-las,porque a emoção
tomava conta e, ela chorava emocionada.
De tudo o que ouvi, tenho a leve sensação de ter vivido com eles e, participado de tudo, pois sempre fui, grande admirador destes valentes guerreiros.
Mais uma vez Angela, parabéns.
Agora te peço, se póssível, passe a foto da Bisavó "Olivia Baptistella" para o meu e-mail: jodioli_gov@hotmail.com
João Diógenes de Oliveira
Cordiais Saudações e Feliz Natal.
03 de dezembro de 2009

Unknown disse...

Pesquisando sobre Sanguinetto somente hoje encontrei seu blog Angela e adorei. Não tem como se não se emocionar com essa história tão linda! Para mim serve como inspiração para continuar nas minhas pesquisas. Já que meu bisavô também consta que é de Sanguinetto e veio para o Brasil em 1888 com 5 anos, juntamente com seus pais Giuseppe Moreschi e Maria Martini e sua futura esposa (na época com 4 anos) Pasqua Lazzaretti. Mas ainda busco por informações sobre meus trisavós para completar a historia da família.
Parabéns e felicidades
Sandra