A mala
Última semana do curso. Cida já não aguentava mais de saudade do marido e resolveu voltar dois dias antes do término das aulas.
A saudade já começava a doer em todas nós. Cada uma voltaria para suas vidas e não sabíamos se depois tornaríamos a nos encontrar.
O Brasil é um país imenso. Fortaleza, Campo Grande, São Paulo e Porto Alegre são cidade muito distantes. Só mesmo uma viagem de muitas horas ou de avião.
Foi na hora de arrumar as malas que percebemos o quanto de roupa desnecessária levamos e, quantas “lembrancinhas e badulaques” compramos nos passeios. Assim, começamos todas a nos organizar.
Neste momento, Glória percebeu que havia uma mala cheia de roupas que não usou e nem usaria. Eram roupas de alto verão e, na Itália, mesmo sendo primavera, ainda fazia um friozinho, principalmente para nós que vivemos nos trópicos.
A idéia que teve foi “sui generes”. Pediu pra Cida um grande favor: “Levar com ela a sua mala grande, pesada e cor laranja para Fortaleza”. Glória acompanharia Cida até Roma e a ajudaria a embarcar, caso fizesse este favor.
Mas, pasmem, Fortaleza e Porto Alegre são cidades que distam mais de 3000 km (em linha reta). Só mesmo indo de avião.
Cida, surpresa com a proposta não sabia o que dizer mas a amizade falou mais alto. Claro que levaria… Glória disse que no final do ano, no verão brasileiro, faria uma visita a ela e pegaria a mala de volta com todas as suas roupas.
A despedida foi demorada e, quando abracei Cida, foi como se abraçasse uma irmã. Choramos… Éramos as duas choronas do apartamento.
No caminho para Roma o transporte das bagagens foi um sucesso. Por duas vezes tiveram de mudar de trem. Mas nestas horas sempre aparece um santo pra ajudar. Apareceu um indiano para carregar a tal mala laranja, e Glória pode auxiliar a Cida com sua bagagem, que não era pouca!
Esse indiano, Asif Zariwala, representava 4 famílias indianas cujos homens faziam os bordados das roupas de Giorgio Armani.
Glória ganhou dele uma niqueleira toda bordada, e um cartão, lindo. Ele não falava italiano, só indiano e inglês. Ela não fazia idéia do idioma indiano nem do inglês, mesmo assim, ignorante que era nesses idiomas, foram trocando idéias, nem me perguntem como.
Pior, quando chegaram a Roma, Glória, num agradecimento espontâneo, deu um abraço e um beijo no rosto, do indiano. Podem imaginar o quanto ele ficou sem graça? Parado, ao pé da escadaria, depois de alguns segundos, ela se virou e ele, ainda no mesmo lugar, abanou a mão, com um lindíssimo sorriso que mostrava a dentadura perfeita.
As duas passaram a noite no aeroporto e combinaram de não chorar na hora da despedida. E, assim foi, até que depois quando cada uma tomou seu rumo, desabaram a chorar.
Entre lágrimas e sorrisos, um olhar de companheirismo e confiança. Foram menos de 30 dias e tudo aquilo ficaria para sempre guardado na memória e no coração.
No dia seguinte retorna Glória, portando porém, outra mala enorme, verde limão fosforescente. Era tão grande que caberia ela própria dentro da nova mala.
Surpresas com o fato perguntamos para que comprara outra mala. – Bem, disse ela… é que ainda tenho outras tantas coisinhas… Além da mala, comprara também uma enorme sombrinha.
Creio que não poderíamos chamar aquilo de “sombrinha” porque estava mais para guarda-sol que exatamente para sombrinha. Colocando em pé, tinha quase a sua própria altura. A explicação foi simples: Gosto de tudo grande!
O curso terminava na sexta-feira e, todas nós teríamos de desocupar o apartamento, o mais tardar, no sábado bem cedo.
Cada uma tinha um projeto diferente. Eu iria para Verona. Queria conhecer a cidade natal dos meus avós e conhecer alguns parentes do norte da Itália.
Minha amiga continuaria por mais uma semana na Itália porque depois deste tempo se integraria à outra turma de brasileiros para uma excursão rumo à Grécia , Turquia e Egito.
Ela pensava, em princípio, ir para Roma, onde tinha algumas amigas de sua tia e, também porque era alí que se encontraria com a turma de brasileiros.
Mas, houve alguns desencontros e de qualquer modo ficaria um tanto sozinha numa cidade que já conhecia. Convidei-a para vir a Verona comigo.
Convite aceito.
Ainda antes da semana terminar fomos até uma agência e compramos as passagens de trem. Primeiro até Fabriano e depois até Verona.
Glória iria para a Costa Azurra, cidade de Hière, na França. Mas sua passagem era só para a terça-feira. Assim, meio de última hora, resolveu ir à Verona também. Só que ela não tinha as passagens.
Na estação, deixamos as bagagens com minha amiga e fui com a Glória até a bilheteria. Não era possível escolher o lugar, mas depois de alguma cara feia do “biglietaio” conseguimos o mesmo vagão.
Na Itália, depois que se compra a passagem se deve ir até uma máquina para validá-la. Ali, é automaticamente impresso o horário e só então, a passagem começa a ter validade.
Na pressa e com tantas bagagens pesadas para colocar dentro do trem, Glória esqueceu-se de validar.
Já dentro do trem , sem lugar para se acomodar, sentou-se em cima da mala verde-gafanhoto e assim estava quando apareceu o chefe pedindo a passagem.
Ela o fez com naturalidade, mas… surpresa…: “Signora, questo biglieto non é stato convalitato. Ora deve pagare 50 euro di molta”.
O sorriso de Glória desabou. Imaginem , por um trecho pequeno, onde pagara pouco mais de 2 euros, ter que pagar uma multa de 50 euros!!!
Não adiantou dialogar… Regras são regras e devem ser cumpridas. Pela primeira vez vi lágrimas escorrerem do seu rosto. Não eram exatamente de tristeza, mas de raiva. Assim, neste clima desembarcamos e tomamos o outro trem.
Alí mais uma surpresa esperava por Glória.
continua
5 comentários:
Estou fascinada de rever todas
essas peripecias, que presenciei pessoalmente e que enche meu coraçao de saudades!!
Nossa, que viagem! Esta Glória... tsk tsk tsk. Verde Limão?!?! kkkk
Adorável ler. :D
Oi querida! fiz outro blog porq aquele não estava atualizando, se quizer pode vir conferir, bju**
Pensamos demasiadamente
Sentimos muito pouco
Necessitamos mais de humildade
Que de máquinas.
Mais de bondade e ternura
Que de inteligência.
Sem isso,
A vida se tornará violenta e
Tudo se perderá.
(Charles Chaplin)
Hoje passando para desejar um final de semana com muito amor e carinho.
Abraços do amigo Eduardo Poisl.
Amiga é caso para dizer porcamiséria, mas que homem mal humerado, coitadinha da nossa amiga glória.
Que fracasso quando tudo já estava a caminhar tão bem, um contratempo desses não veio nada a calhar.
Mas que fazer neste caso foi aguentar e cara triste.
Beijinho em seu coração
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